Vocativo Académico

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Vós que me tendes por outra voz
que não a minha
para em vão chegar a coisas certas
como o esvaziamento de mim por outros
logo agora que me autonomizava…

Na compreensão cabe ser ininteligível sendo, aliás, esse o seu ponto crítico. Nem tudo quanto se diz se compreende, certamente menos se faz do que se diz e muito se faz sem que se compreenda, mas a palavra precede o que no início era verbo.

Pedis uma liberdade a rememorar estilhaço de chibata, liberdade que carregue ouro e prata, galões e galhardetes, e outras coisas pelas quais se consinta que se rasguem raízes ou carnes.

Gosto de vento na tromba de água de que tudo é feito. Sou rosto para o composto larvar de um antiquíssimo leito dos que rastejam no húmus do território, que com seus gases pequenos, passageiros, e humidades de minhoca nacionalizam o presente e na tripa o passado, contido, submisso, decepcionado de qualquer coisa não ter sido outra embora ninguém assevere o que foi, nem reine a certeza do que poderia ter sido, mas nada escapa às merdas.

O dever é um presente desenhado no futuro. Nem vítimas da fome, de pé, racializando o socialismo. Nem heróis do mar que esse é um portento invencível, heróis dessa água na tromba de que a história do fluxo se vai tecendo. Consolida a vontade de mudança, permanente, paciente, relutante, reflectora no chão calcetado a ombros sob o céu prenho de espíritos nomeáveis, quantificáveis à infinitude exangue de nome para mais que isso.

Deixai-me fala para lá da compreensão, se for o caso. Se não o for, não guardeis na pobreza o socialismo. Levai-o por aí, onde eu iria se me deixassem não saber de nada que não emergir de uma tromba de água ou aprender a resvalar na corrente. Disponho-me a deixar-me levar e, de tempos em tempos, ser folha encalhada numa bruma de rio.

Ao curso se impõe o calhau, em que a folha se aconchega, de face embalada pela água que a convida a desprender-se num breve esforço se ao menos não houvesse mais uma dúzia de folhas que se quedaram protegidas pelo mesmo calhau na margem, umas em cima das outras, sobrepondo-se, resvalando juntas na corrente. Folhas secas e algas mesmo abaixo, seres aquáticos, de pé firme na caudal, comendo dele, festim na tromba de água. Num rio que dá sempre para o mar, que mar não viu a alga doce?

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